A FEIURA NÃO É UM PROBLEMA
OBS.: A história é
verdadeira, mas os personagens foram criados pelo autor.
Dizem que existem dois tipos
de beleza: a interior e a exterior. Uns chegam a afirmar que a mais bela delas
é a interior e que a beleza exterior se
consegue com as chamadas cirurgias plásticas. Pode ser verdade ou pode ser
apenas uma forma de se justificar que a feiura tem conserto.
Glória Maria era uma prova
de que beleza é coisa rara e que não se pode confundir com simpatia ou algo
semelhante. Certa vez ao vê-la passar na Praça da Babilônia, comentei com um
colega, que se Eva era o símbolo da perfeição, certamente diante daquela glória
não passava de uma simples mulher.
Ouvi certo cidadão já em sua
meia idade fazer o seguinte comentário ao vê-la passar diante dele:
- Essa aí mata qualquer um
do coração! A forma onde ela foi feita jogaram no fundo do mar para não fazerem
outra igual!
A mulher que estava ao seu
lado deu-lhe um beliscão que o fez soltar um estrondoso grito de AAAAAAAAI!
Glória Maria deixava
qualquer um louco. Mas se eu disser a vocês que ela namorava um sujeito
desajeitado, daqueles que parecem ter esquecido de tirar a máscara depois do
carnaval, vocês vão dizer que eu estou brincando com coisa séria. Mas era a
pura verdade. Ela namorava o Germano.
Ludmila, uma das poucas
colegas íntimas da Glória, em tom de brincadeira, chegou a perguntar se ela
estava girando bem ou estava com febre de 40 graus, no momento em que oficializou o namoro com o Germano. Meio sem
jeito, ela respondeu que por fora, ele não era lá essa beleza toda, mas por
dentro era um verdadeiro deus da mitologia grega.
Disse que ele era
inteligente, de boa família, era um filho exemplar e querido por todos aqueles
que dele se aproximavam. Finalmente, ela o encheu de qualidades que, juntas,
por mais esforço que se fizesse, não conseguia superar a feiura que o acompanhava
desde o berço.
Mas o mundo está repleto de
pessoas que, por mais que você tente entende-las, não tem como conseguir. E
Glória, infelizmente, fazia parte dessa elástica estatística.
Certo dia, nas proximidades
do Cine São Francisco, na descida para a chamada Rua da Baixa, encontrei o Germano agarrado
com uma coisa que só descobri que era gente quando ouvi um tenebroso gemido acompanhado
da advertência: – cuidado que vem gente
aí!
Conversando com alguns
colegas a respeito da minha trágica surpresa, eles disseram que eu estava
delirando. Para eles, assim como para todos nós, namorar uma preciosidade como
a Glória Maria já era mais que suficiente para não olhar outras garotas da
região.
Diante daquela cena terrível
e covarde, fiquei tão revoltado que não resisti e procurei a Ludmila a quem
contei tudo o que havia visto. E contei tim tim por tim tim. Não era justo
saber que uma obra prima fosse trocada por uma réplica de monstro e permanecer
calado! Ah... estão me chamando de fofoqueiro? E você? Não faria o mesmo?
Um dia, conversando com um
sacerdote, falei sobre a beleza da Glória Maria. Ele ficou tão empolgado que,
esquecendo a batina que o cobria, replicou:
- Aquilo não é coisa desse mundo! É uma
verdadeira obra Divina!
E deu um longo suspiro.
Depois olhou sério para mim e disse:
- Esqueça o que eu disse!
Nós dois acabamos dando uma
gostosa gargalhada. Ora, se um padre não resistia ao ouvir falar daquela
escultura humana, o que dizer de um pobre pecador como eu que estivera frente a
frente com aquela pérola em forma de pessoa?
Um ancião, assíduo
frequentador da Praça da Bengala, bem em frente à barbearia do João da Cruz,
vendo-a passar por ali, baixou o óculos, deu uma olhadela maliciosa e murmurou
olhando para um colega ao lado:
- Olha lá, colega! Com uma
daquela ali, a gente nem precisa de estimulante, mesmo que seja da cor do céu!
O outro melancolicamente
respondeu:
- Ai, ai, meu amigo! Logo
eu, que nem consigo erguer esta maldita bengala!!!
Certa manhã de sábado, quando
eu menos esperava, eis que aparece à minha frente, na calçada da Itatiunga,
aquela beldade encantadora. Saltei um ôpa ao chocar-me com ela e ela reagiu com
seu jeitinho angelical:
- Quase te derrubei, hein!!
Tive vontade de responder:
- Sendo amortecida por este
corpo escultural, qualquer queda seria bem vinda!!!
Mas preferi dizer apenas:
- Sem problemas! Ela me
chamou para sentar um pouco na Praça da Pelota! Que resposta vocês acham que eu
dei?
Educadamente, pedi uma
Coca-Cola e dois copos. A conversa durou mais de uma hora, tempo suficiente
para que ela me perguntasse o que eu achava do namorado dela.
Lamentou as críticas que lhe
eram dirigidas por algumas colegas e por pessoas que se metiam nas vidas
alheias. Eu tive que usar de artifícios até encontrar uma maneira de dizer que
ela ao lado dele ficava mil vezes mais bela.
Ela se fez de desentendida,
mas me lançou um sorriso meio pálido. Então eu corrigi:
- Não se preocupe com os
falatórios! É que existem pessoas contaminadas pela inveja! Mas eu seria
injusto se lhe dissesse que ele nasceu para você!
Aí mandei a cartada final:
- Você já pensou como serão
os filhos de vocês? Ela se tocou, baixou a cabeça e resolveu mudar de assunto.
Dias depois eu fiquei
sabendo que o namoro entre ambos havia chegado ao fim. Quando os amigos
comentavam o fim do romance de Glória com Germano, eu dava a mesma resposta:
- Sorte dos futuros filhos
dela! É triste pagar pelos erros dos outros, principalmente quando o preço é
muito alto!
- Por Adalberto Pereira –
Nenhum comentário:
Postar um comentário