LUCRÉCIO, O DETETIVE.
Todos nós temos um sonho de
criança e ele nasce dentro de nós de forma mágica, mesmo contrariando outros
sonhos bem mais fecundos. Meu sonho era ser motorista de caminhão! Eu ficava
deslumbrado vendo um Chevrolet carregado saindo de Campina Grande para São
Paulo ou Rio de Janeiro. Meu pai ficava uma fera, pois o seu sonho era ter um
filho doutor. Teve que se conformar vendo o filho optando pela chata, mas
gostosa profissão de radialista, depois de não obter sucesso como agrônomo.
Mas o sonho do menino Lucrécio
era ser detetive. E qual não foi a surpresa dos colegas de colégio quando a
professora perguntou o que os alunos queriam ser no futuro e ouviram do
Lucrécio: “Eu quero ser detetive, professora!”.
Detetiiiiiive??? Bradou a
classe, como se tivessem ensaiado um coral natalino. Mas detetive é muito
chato! Comentou Ariosto, acrescentando: “Pois eu quero mesmo é ser jogador de futebol!”.
Houve um início de tumultuo até que a professora apaziguou os ânimos, mudando
de assunto.
Os dias passaram e num certo
momento, alguém gritou lá dos fundos: - Professora, a minha caneta desapareceu!
Houve uma mudança de comportamento da turma. Cada um se manifestava dizendo não
ter nada com a história. A confusão terminou na Diretoria. Ariosto aproveitou a
confusão para ironizar o colega: - Vai, detetive, descobre quem pegou a caneta
do Fabrício! A gargalhada foi geral. Mas Lucrécio permaneceu indiferente a
tudo.
Dias depois, Lucrécio chegou
mais cedo e procurou a professora Valquíria e, sussurrando ao seu ouvido disse:
- Eu descobri quem ficou com a caneta do Fabrício! Pasmada, a professora chamou
o garoto a disse: - Isso é assunto da Diretoria! Você vai ter que contar ao Dr.
Rosalvo, nosso Diretor. O aluno acusado foi chamado e choramingando, devolveu a
caneta do colega e foi sumariamente expulso da escola, para servir de exemplo.
Eufórico com o prematuro
sucesso, Lucrécio chegou em casa e correu até a cozinha onde d. Leonora, sua
mãe, estava ultimando os preparativos para o almoço. Eu vou ser detetive, mãe,
disse ele na maior felicidade. D. Leonora olhou para o filho com as duas mãos
na cintura e retrucou:
- Detetiiiiive? Que diacho é isso, minino?
Depois de ouvir as explicações do filho, deu um resmungado e completou: -
Espera só pra vê a cara de teu pai quando tu disser isso pra ele!
Dito e feito! Mal entrou em
casa, seu Belízio ouviu um grito vindo da cozinha: - Chega aqui, hômi! Vem
ouvir a história que teu fio tem pra te contá! Ele deu um suspiro de alívio por
ter chegado em casa, tirou o chapéu de palha, jogou em cima da mesa e, olhando
para o filho, perguntou: - Qui história é essa qui tu tem pra mi contá, minino?
Depois de ouvir as
explicações de Lucrécio, o pai com a mão no queixo, como se estivesse lembrando
algo, replicou: - Já mi falaru desse tá de detetive particular! Num é aquele sujeito
que ispivita a vida alheia? Minino, minino! Tu num sabe onde tás metendo a
venta! Isso é muito perigoso, meu fio, mas se tu aguenta o rojão, isso é
problema teu! Olhou pra d. Leonora e gritou: - Bota o almoço, muié que história
de trancoso num enche a pança de ninguém!
Lucrécio não desistiu!
Matriculou-se no IUB – Instituto Universal Brasileiro e lá foi ele meter a cara
nos livros de “Detetive Particular”. E não é que conseguiu!!! Passados dois
anos, lá estava o Lucrécio recebendo o seu diploma e o distintivo de Detetive.
Agora já podia arranjar uma namorada, casar e ter uma família como sempre
sonhara!
Lucrécio ficou famoso pelos
casos por ele resolvidos. E haja cliente à procura do detetive mais procurado
da cidade. Uma senhora bastante aflita o procurou para um caso meio complicado:
uma amiga, daquelas fofoqueiras, confidenciou pra ela que o marido dela
tinha uma amante. Isso a deixou muita
chateada e precisava tirar a limpo essa
história! Para ela, o marido era muito carinhoso e sua fidelidade, até aquele
momento, era incontestável. Mesmo assim, procurou o detetive Lucrécio.
- Não se preocupe minha
senhora! Casos piores eu tenho resolvido! Isso pra mim, é “café pequeno”, disse
o detetive, deixando aquela aflita senhora mais conformada. “Pé na estrada”,
Lucrécio iniciou as investigações. Foram dois meses de um trabalho difícil, mas
não impossível. Passo a passo, ele acompanhava as trajetórias do marido
traidor. Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura, lá estava o sujeito
em companhia de uma mulher que, cuidadosamente cobria o rosto para não ser
descoberta.
Mas ai daquele que caísse
nas mãos do detetive Lucrécio! Sorrateiramente, ele foi se aproximando do
“misterioso” casal! – Em algum momento, ela vai ter que descobrir o rosto –
pensou Lucrécio consigo mesmo. Demorou, mas chegou o momento! Pronto!!! É
agora. Preparou a câmera preparada para fotos noturnas e... clik... clik...
clik! Três fotos para não ter dúvidas! Deu meia volta e eufórico pelo sucesso
da investigação, correu para casa a fim de revelar os negativos e saber quem
era a ”cabeça de porco” que tomara o lugar da esposa traída.
Lucrécio teve um sobressalto
ao ver a foto! Não é possível, pensou! Você??? Era a sua esposa! O feitiço
virara contra o feiticeiro! A mulher que tanto sonhara ter como esposa e com
ele construir um lar feliz? Parecia estar tendo um pesadelo! Sentiu que o mundo
desmoronava ao seu redor! Viu se abrir um abismo diante de si! Pasmado, não acreditava
que a “princesa” dos seus sonhos fosse capaz daquilo! A dor que sentia naquele
momento era sem limites! Era como se tivesse recebido uma punhalada no coração.
Ah se soubesse que ser
detetive não era tão deslumbrante como pensava! Deixara ser levado pelas
emoções e olhem no que deu! Naquele momento lembrou-se das palavras do pai: “Minino,
minino! Tu num sabe onde tás metendo a venta!” – Meu pai tinha razão! Acabei
metendo o nariz onde não devia! – pensou ele sufocado pelas lágrimas. Um
martírio tomava conta do seu coração: como relatar o fato à mulher traída?
Chorar junto com ela? Fugir para bem longe e deixar tudo pra trás?
De repente, como se tivesse
encontrado a resposta para suas perguntas, levantou-se daquela cadeira
incômoda, limpou as lágrimas dos olhos com as costas das mãos, juntou todo material
que utilizara no trabalho, meteu tudo num saco e atirou num depósito de lixo.
Daquele momento em diante,
Lucrécio nunca mais quis saber das palavras DETETIVE PARTICULAR! Agora, uma
dúvida a ser resolvida: Ele não sabia se fora traído mais pela profissão ou simplesmente
pela mulher amada!
MORAL DA HISTÓRIA: Nem
sempre a primeira impressão é a que fica. Ela só perdura enquanto a percepção
não chega.
- Criado por Adalberto
Pereira –
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